Aprovado o menos medíocre

Carlos Costa foi reconduzido à frente do Banco de Portugal (BdP). Até aqui, nada de novo. A novidade, e por sinal surpreendente, é que o relatório de audição da personalidade indicada pelo governo para o cargo foi aprovado, na passada quarta-feira dia 24 de Junho, na comissão parlamentar de Orçamento, Finanças e Administração Pública, com os votos favoráveis não só do PSD e CDS, como era de esperar, mas também do PCP. E contou ainda com a abstenção do PS. O socialista Eduardo Cabrita, presidente da comissão, criticou o relatório, mas não votou contra. Já o BE fez o que muitas vezes faz, numa filosofia de partido eternamente da oposição que recusa assumir responsabilidades em atos de governação: nem se dignou comparecer à votação.

Tantas vezes criticado e julgado na praça pública, Carlos Costa transportou a cruz que cabia também ao governo e foi totalmente descredibilizado pela oposição. Foi esmagado por acusações de responsabilidade na queda do império do BES, às quais respondeu, de forma infeliz mas com alguma razão, que não roubou ninguém.

Não terá sido Carlos Costa quem falsificou a contabilidade do BES/GES. Também não foi ele que vendeu papel comercial da Rioforte como se de capital garantido se tratasse. Mas cabia ao governador do BdP evitar mais um escândalo deste tipo na banca portuguesa, ainda para mais sendo gato escaldado. Mesmo que não tivesse os instrumentos legais para obrigar Ricardo Salgado a afastar-se da administração do BES, Carlos Costa tinha conhecimento das irregularidades há mais de um ano. No mínimo, devia ter ordenado uma auditoria especial ou feito uma denúncia às autoridades. Mas não teve coragem de crescer perante o temível gigantismo de Ricardo Salgado. Encolheu-se e calou-se, e com isso ruiu mais um banco português, foi engolido o gigante nacional das telecomunicações, perderam-se as economias de uma vida de centenas de cidadãos portugueses e a economia portuguesa sofreu mais um revés.

No final de tudo, rematou com o melhor que pôde, que foi afinal o menor mal possível: o processo de resolução do BES. Não foi uma boa solução, foi a menos má. Carlos Costa esforçou-se e conseguiu ser o menos medíocre possível.

O governo reconduziu Carlos Costa para governador do BdP sem auscultar o maior partido da oposição em vésperas de eleições. Mas não o fez pelo seu valor como regulador. Nem tão-pouco para premiar a sua mediocridade. O governo pagou uma dívida, a da parcela da cruz que Carlos Costa carregou em seu lugar, assumindo na totalidade o falhanço na condução de todo o processo. Isso não foi uma surpresa. O que surpreendeu foi, depois de tanto tumulto em torno do pelourinho exigindo a cabeça de Carlos Costa, na hora da verdade as vozes mais críticas terem manifestado passividade, e até mesmo apoio, na aprovação do relatório de audição. Será que os deputados não acreditam que se possa fazer melhor?

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