O Governo “A ver vamos”

Cavaco Silva deu finalmente posse ao Governo PS. Porém, muito a contragosto. Confirmou-se: engoliu não só o sapo de dar posse a um governo minoritário, depois do ultimato que fez aquando do discurso em que fixou a data das eleições legislativas, como ainda teve de engolir outro sapo, este porventura maior e mais difícil de escorregar, de empossar um governo de esquerda, que até tem o apoio parlamentar, imagine-se, do Partido Comunista. Sem dúvida de que são demasiados desaforos para um homem da idade do Professor Aníbal.

Mas está na hora de mudar de capítulo. A era de Cavaco está no fim, mais tarde do que cedo, e suspeito de que a imagem de empecilho da democracia e de anunciador do apocalipse não deixará saudades. Já quase nos esquecemos do nosso Velho do Restelo. Concentremo-nos no novo Governo, que agora é tempo de andar para a frente e não de ficar preso a rancores passados.

O ExpressoDiário de terça-feira dia 23 de Novembro, num trabalho notável, apresentou as personalidades que António Costa escolheu para o acompanhar no XXI Governo. Ao contrário do Executivo selecionado por Passos, vê-se que este é um elenco talhado para longo prazo, com pessoas capazes de empreender reformas, de que o Estado português tanto precisa. Ou pelo menos assim parece e assim queremos acreditar. Vou destacar os que mais garantias oferecem.

Maria Manuel Leitão Marques, Ministra da Presidência. Foi a “senhora Simplex” do Governo de José Sócrates. A ela devemos a empresa na hora e o cartão do cidadão, entre outros. Quem melhor para prosseguir a modernização da administração pública, tão apregoada por Paulo Portas, mas que acabou por ficar na gaveta?

Vieira da Silva, Ministro do Trabalho e da Segurança Social. Um dos rostos mais conhecidos dos portugueses neste Governo. Integrou os Executivos de Guterres e de Sócrates, nas Obras Públicas, Economia e no Trabalho e Solidariedade Social. Retorna agora à pasta onde já tem provas dadas, tendo protagonizado uma importante reforma da Segurança Social entre 2005 e 2009.

Manuel Heitor, Ministro do Ensino Superior e da Ciência. É um nome ligado a Mariano Gago, tendo sido seu Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior nos dois Governos de José Sócrates. E isto diz tudo. Basta saber que foi discípulo de Mariano Gago para que todos os homens e mulheres da ciência do nosso país se encham de esperança por uma nova aposta naquilo em que já demonstrámos ser bons, e que traz prestígio, crescimento e dividendos à nação.

Adalberto Campos Fernandes, Ministro da Saúde. A Saúde volta a ter um médico. Apesar de ser uma pasta a necessitar de tratamentos, não é a profissão do Ministro que mais vantagens lhe trará – nem tudo foi um mar de rosas com Ana Jorge – mas sim o facto de este ser um defensor do Serviço Nacional de Saúde, público, mais justo e acessível.

Capoulas Santos, Ministro da Agricultura. É um veterano desta pasta, tendo sido Secretário de Estado e depois Ministro nos dois Governos de António Guterres, com reconhecido mérito. Destacou-se também no Parlamento Europeu nos últimos anos, sendo eleito em 2012 o melhor eurodeputado na área da agricultura. Será um dos ministros mais velhos, mas também sem dúvida um dos mais experientes na sua pasta.

Independentemente da qualidade dos ministros, críticas não faltarão. Há um reabilitar do elenco socratista, algo que traz más memórias a uma boa parte dos portugueses, e que a atual oposição saberá com certeza explorar. Depois, há as “familiaridades”: Mariana Vieira da Silva, filha do Ministro, será Secretária de Estado Adjunta; Eduardo Cabrita, Ministro-Adjunto, é casado com a Ministra do Mar, Ana Paula Vitorino – relações sempre muito criticadas pela suspeita de benefícios ilícitos que levantam.

Os portugueses, quer os de esquerda, quer os mais próximos da direita, sabem que este Executivo tem muito para correr mal, do ponto de vista do instável apoio parlamentar em que assenta. Mas quem sabe? Talvez a vontade da esquerda em mostrar que é alternativa e a esperança nas pessoas que integram o novo Executivo o façam correr bem. A ver vamos.

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