TSU trama PSD – parte 2

Depois do parto difícil que foi o acordo para o salário mínimo (SMN) em sede de concertação social, tudo pode agora regressar à estaca zero. Isto porque o SMN fez-se acompanhar de um gémeo, a descida da taxa social única (TSU) paga pelos patrões. O Bloco de Esquerda tomou a dianteira e decidiu deitar a medida ao tapete, fazendo-a passar pelo crivo do Parlamento. E foi imediatamente secundado pelo PCP. Até aqui, nada de surpresas, uma vez que os dois partidos tinham imediatamente feito saber que eram contra a medida e que para eles o acordo não estava fechado. A reação do PSD, que anunciou votar contra a descida da TSU, é uma mera tática de aproveitamento político, o que também não surpreende quem já se habituou à liderança de Passos Coelho. Deveras interessante é assistir à facilidade com que se transfere o ónus da decisão de deitar o acordo abaixo. Tal deve-se ao mérito do PS e ao demérito do PSD.

Baixar em 1,25% a TSU paga pelos empregadores em relação aos trabalhadores que auferem o salário mínimo foi a moeda de troca que o Governo ofereceu para negociar o aumento do SMN de 530 para 557 euros. Embora o SMN seja uma decisão governamental e não dependa da concertação social, é sempre desejável vincular as confederações patronais para tornar a decisão mais sólida e manter a paz social. No entanto, têm sido apontados potenciais efeitos perversos desta descida da TSU, e é por isso que defendo que seria preferível oferecer outra contrapartida aos empregadores que não mexesse na Segurança Social. Desde logo, a descapitalização da Segurança Social, que assim encaixa apenas metade dos cerca de 40 milhões de euros previstos com a subida do SMN sem esta contrapartida. Em segundo lugar, este atrativo poderá incentivar a contratação de trabalhadores pelo mínimo dos salários. Estas e outras críticas não se fizeram esperar do lado dos sindicatos e dos partidos de esquerda. Mas chovem também do lado de figuras insuspeitas, como Correia de Campos, Manuela Ferreira Leite e Bagão Félix.

Passos Coelho, ansioso por acertar agulhas no rumo da oposição, acaba por escorregar mais uma vez com este anunciado voto contra a redução da TSU no Parlamento. A intenção do PSD é meramente tática e é a mesma de sempre: desgastar as engrenagens da Geringonça. Mais de um ano passado e depois de dois orçamentos, Passos ainda acredita na volatilidade da maioria de esquerda e continua a insistir na estratégia reiteradamente falhada de fazer quebrar o mecanismo.

Ninguém acredita que o PSD não concorde com a medida; aliás, está bem presente na memória dos portugueses a recente tentativa de o Governo PSD/CDS implementar algo semelhante, o que motivou a maior contestação ao Executivo da troika e foi possivelmente o mote para a viragem à esquerda do país. O líder do PSD resolveu reabilitar este fenómeno mas, mais uma vez, leu mal o estado de alma dos portugueses, que respiram alguma esperança pela primeira vez em oito anos e que estão ainda irreconciliados com o Governo da troika. E subestimou o PS, cuja direção atual é dotada de grande habilidade política, conseguindo inverter uma guerra que à partida seria com os seus parceiros de acordo parlamentar para uma cómoda guerra com o principal partido da oposição. É impossível resistir a dizer que o PS mata assim dois coelhos de uma cajadada.

É assim que, numa inesperada reviravolta do jogo, o PSD acaba por ser o elemento que faz a careta na fotografia, mesmo que tenham sido o BE e o PCP a atear o lume. Passos Coelho consegue a proeza de ser alvo das críticas de todos, desde PS, UGT e partidos da esquerda, passando pela ira do Presidente da República, e merecendo até um “devia estar calado” por parte da correligionária Ferreira Leite. E até o inimaginável se torna possível: a CGTP está contente com o PSD (http://observador.pt/2017/01/12/cgtp-contente-com-contestacao-do-psd-a-descida-da-tsu/).


É possível que o PSD ainda arrepie caminho. Se não o fizer, estará a ajudar a Geringonça, pois o Governo dará aos patrões outra contrapartida, possivelmente um desconto noutra taxa, satisfazendo não só as confederações patronais como também os partidos de esquerda. Se o PSD mantiver a sua intenção de voto contra a TSU, será esmagado pela crítica desde a esquerda à direita, fragilizando ainda mais o seu lugar no atual teatro político. Seja como for, será sempre o PSD de Passos Coelho a perder.

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